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CASO SUSLLEN MENEGUZZI TONANI

Susllen Meneguzzi Tonani, Minha querida, você tem idade de ser minha neta. Tenho exatamente a idade do seu agressor, 67 anos. O tempo, porque é uma abstração, coloca-nos muito próximas, embora a cronologia acentue a longa distância entre nós duas. Escrevo-lhe com a ternura de avó, mas, a fim de evitar pieguices, afastei-me de qualquer possibilidade de protecionismo. Somos adultos e responsáveis pelo que falamos, escrevemos e praticamos. Posso avaliar o quanto se sentiu humilhada e, de imediato chamo-lhe a atenção para já iniciar o processo de superação, antes mesmo da cicatrização da ferida. Alguma sequela, grande ou pequena, ficará registrada na carne e na alma. E, conviver com este fardo, exige constante reparo para não amargarmos, virarmos chumbo e tornarmo-nos inócuas figuras dentro de nossa própria existência e na comunhão desta com o mundo. Seu agressor é um homem ”mutilado”, mas você, a vítima, se já não era um ser “mutilado”, torna-se também um, pois lhe roubaram uma significativa porção da sua integridade física e moral. Quando tal violência acontece na infância da mulher, os danos são imensuráveis e suas consequências quase sempre irreversíveis. Quanto mais, na escuridão e no silêncio, ficarem os traumas sofridos, mais pesada será a carga psicológica que teremos de sustentar pelo resto da vida. Transformar esse fardo em leveza é possível, mas requer um exercício constante de elaboração pessoal e social. A sociedade precisa saber que ambas as partes, agressor e vítima, precisam ser tratadas e restauradas. Para isso, no entanto, é imprescindível que, você e José Mayer queiram e façam por onde conquistar razoáveis, bons ou excelentes frutos com essa empreitada cheia de desgastes e sofrimentos. O certo e menos oneroso é a prevenção, mas, uma vez consumada a ilicitude, devem-se tomar as providências cabíveis. Há meios e mecanismos que podem e devem ser utilizados, porém, todo cuidado deve ser tomado ao escolhermos tais diligências. Minha intenção, Susllen Meneguzzi Tonani, não é acirrar os ânimos e muito menos acovardá-los; minha inserção no caso em pauta tem o propósito de conduzir todos os possíveis leitores ao discernimento, ao equilíbrio e à mais coerente compreensão possível. Filtrar as notícias já indica um bom começo para quem pretende, de algum modo, “imiscuir-se” no que aconteceu entre um ator e uma figurinista. Confesso, a despeito de amar escrever, sinto-me triste diante desse e de tantos outros fatos que denigrem as relações humanas. Também, creia, não me escandalizo. Procuro viver entre tudo e todos com a consciência de que, em menor ou maior escala, tudo é provável de acontecer. Repito aos meus alunos três frases: se falta higiene, não há educação, se eu não me liberto da inércia, logo poderei ser manipulado pelos sistemas e os extremos são sempre perigosos. Entenda-se higiene como o devido asseio que se precisa ter no corpo, na mente e em todos os setores da vida. Entenda-se extremos como tudo aquilo que se distanciou do equilíbrio. Entenda-se inércia como a acomodação que nos afasta de refletirmos e agirmos melhor, seja a nosso favor, em benefício de uma coletividade ou, concomitantemente, em proveito pessoal e geral de uma sociedade. Viver bem dá muito trabalho. Quanto à violência cometida pelo ator José Mayer, denunciada por você, por si só, caracteriza-se como sem asseio, sem decência, ou seja, sem educação; extremada, ou seja, sem equilíbrio e, por fim, acomodada, pois se fiou em parâmetros obsoletos e irrefutavelmente inaceitáveis, agora e sempre. Por favor, considere o parágrafo seguinte como um parêntese de cunho linguístico. Ele existe devido a um hábito meu de observar tudo de uma dada circunstância. Seu conteúdo, em hipótese alguma menospreza as razões legítimas da vítima que deve proceder usando de todos os seus deveres e direitos, tampouco atenua a culpabilidade do agressor que também deve proceder usando de todos os seus deveres e direitos. Existem um fato, uma vítima, mais uma no cenário nacional e um outro agressor, réu confesso ainda “meia-boca”, como se já não bastasse o número elevado de infratores desse tipo, e todas as pessoas de bom senso esperam que a Justiça honre a balança e a venda que simbolicamente ostenta. Pois bem, uma palavra no seu discurso me chamou a atenção. Lidamos com as palavras orais ou escritas, o tempo todo. Isso não é um privilégio do escritor. Este, no entanto, tem o dever de saber usá-las com mais adequação e, se possível, com mestria. Um escritor não deve discriminar palavras. Mantenho-me atenta para não incorrer nesta falha, mas, Susllen Meneguzzi Tonani, não devo deixar passar a falta de adequação quanto ao uso das palavras ou expressões, observando e considerando quem as usou, bem como as circunstâncias em que foram usadas. Resumindo, estou curiosa por saber o porquê de você ter usado a palavra “buceta”. Foram o nervosismo e o exaspero? Escreve-se "boceta" e, por mais tal expressão possa ser utilizada em muitos contextos e de muitas e inusitadas maneiras, agressiva, carinhosa e cômica, para citar apenas estas, na situação vergonhosa e deplorável, envolvendo você, a vítima, o agressor, José Mayer e toda a mídia, “buceta”, partindo de você, rouba um pouco o caráter grave do acontecido. Portanto, minha menina, você usou mesmo esta palavra para denominar a sua vagina? Ou, equivocada, deixo-me levar por uma distorção, por um “ruído” midiático? No entanto, se genitália, vagina, vulva, “buceta” ou "boceta", a mão esquerda de José Mayer precisa arcar com o ônus acarretado, pois o critério da sinonímia não se aplica às expressões atitude ilícita e “brincadeiras”. Retomando ao que mais interessa. Que esposa, sem precisar abandonar seu marido ou ser abandonada por ele, sairia a favor da mulher que assediada ou violentada sexualmente foi por esse homem? Sobrarão dedos se arriscarmos a contar as personagens de alguma resposta. Considerando a realidade social brasileira, não há ilusões. Há, sim, uma legião de mulheres, casadas, solteiras, mais velhas, mais jovens, dependentes ou emancipadas, que estão aliadas ao seu agressor, criando justificativas e hipóteses de que você foi a culpada. Isso é lamentável. Enquanto mulheres e homens não se ajustarem em favor do bem-estar coletivo, enquanto homens e mulheres não elaborarem a própria sexualidade, evitando, assim, praticá-la em detrimento de quem quer que seja, enquanto nós nos omitirmos de nos colocarmos no lugar da outra pessoa, tenhamos certeza, ilicitudes continuarão a ser abençoadas pela esperteza, impunidade e pelos “podres poderes”. E, nessa marcha, perdemos em qualidade de vida, pois nos agarramos apenas ao que é importante, como dinheiro e tudo o que ele pode comprar, e abrimos mão do essencial, como a decência, a moral e a educação. Por fim, Susllen Meneguzzi Tonani, não permita que este acontecimento a subtraia. Nas aparências socioculturais, sabemos, o lado mais fraco da corda é você, apesar de ser a vítima. Mas, sabemos também que você não está sozinha. Somos milhões de andorinhas e queremos, exigimos e fazemos por onde vivermos, plenas em harmonia e isonomia de gêneros, em todas as estações. “MEXEU COM UMA, MEXEU COM TODAS” E COM TODOS que se respeitam. Walkyria das Mercês


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